sábado, 23 de julho de 2011

Tentações


By: Humberto Ferreira 
 
     Todos trazemos, de outras vidas, tendências boas e más; as primeiras impulsionam-nos para a senda do bem, e são estimuladas pelos bons Espíritos e pelos homens de bem; as más arrastam-nos para o caminho do mal, e são incentivadas pelos Espíritos imperfeitos e pelas pessoas de carácter inferior.

     Os bons Espíritos aproveitam as nossas boas inclinações para nos estimular a viver de maneira equilibrada e a praticar o bem; por outro lado, os Espíritos pouco adiantados, viciosos, exploram as nossas propensões inferiores, induzindo-nos a agir em desacordo com as leis de Deus e a seguir uma vida cheia de vícios e de ilusões. 
     Os Espíritos inferiores, de má índole, envidam todos os esforços para nos fazerem cair em tentações; utilizam os nossos maus pendores para nos influenciarem os pensamentos e actos. Sempre que descuidamos da vigilância, interferem nas nossas conversações, induzindo-nos a falar compulsivamente, a usar palavras inadequadas, fortes, agressivas; fortificam-nos as compulsões, inclusive alimentares; arrastam-nos para os vícios, para o sexo menos responsável ou mesmo desregrado; interferem em nossas actividades, inclusive no campo da mediunidade, predispondo-nos às mistificações; alimentam-nos o orgulho e a vaidade e a consequência destes, que é o melindre... 
     Muitas vezes, não querendo admitir as próprias fraquezas, procuramos encontrar em outras pessoas, ou na falta de protecção espiritual, as razões dos nossos desacertos; mas, se agimos honestamente, descobrimos que somos os verdadeiros responsáveis por eles. 
     Estamos ainda distantes da perfeição, com muitos defeitos a vencer; por isso, constantemente sofremos as influências das forças espirituais do mal, e, em razão disso, nossos desacertos são numerosos. 
     O que fazer para reverter a situação? 
     Ensinam-nos os Espíritos que somente ficaremos livres das más influências dos Espíritos imperfeitos (e naturalmente dos homens de más tendências), quando eliminarmos as imperfeições. Enquanto não conseguirmos atingir essa meta, os Espíritos recomendam- nos alguns recursos, de indiscutível eficácia: vigilância constante, com a sublimação dos pensamentos, sentimentos, linguagem e actos; oração diária e em todos os momentos em que percebermos as más influências; leitura edificante (O Evangelho segundo o Espiritismo, por exemplo) todas as vezes em que detectarmos sugestões negativas; recolhimento e meditação; cultivo da paz e serenidade; combate às imperfeições. 
     Podemos pedir a assistência dos bons Espíritos, que atendem prontamente aos nossos pedidos, nos amparam e inspiram bons pensamentos. Além disso, nos auxiliam nos esforços que fizermos para combater as imperfeições e as más tendências. Com certeza, obteremos bons resultados se soubermos aproveitar essa ajuda espiritual para controlar os impulsos inferiores e evitar as sugestões negativas dos que querem nos converter em instrumentos vivos do mal. Com esforço próprio e perseverança, pouco a pouco, poderemos nos aperfeiçoar moralmente, libertando-nos das influências das forças espirituais do mal. 
     Com humildade e sintonia constante com os bons Espíritos, seguramente conseguiremos alçar voos mais altos na conquista da Espiritualidade. 
Revista Reformador Dez/2007                 

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Fazendo a Paz com o Mundo


Por quanto tempo conseguimos nos manter felizes?

Porque razão quando tudo vai bem, emerge de nosso interior um pensamento que nos desequilibra?

Isto ocorre porque temos dois tipos de emoções mentais: as latentes e as manifestas. Quando um estímulo desperta uma emoção latente, ela amadurece e se manifesta automaticamente.
Em outras palavras, é como se dentro de nós tivéssemos um campo minado de raiva, ciúmes e orgulho, bastando tocá-lo para ele explodir. Se não desactivarmos essas bombas internas, estaremos projectando a causa de suas explosões em nosso mundo exterior. Enquanto buscarmos um bode expiatório para nossos conflitos interiores, nossos inimigos interiores irão se manter imperceptíveis e cada vez mais poderosos.

A felicidade externa depende, portanto, de nossa clareza interna. O auto conhecimento depende, entretanto, de nossa dedicação ao mundo exterior. Pois é a relação com o mundo exterior que nos ensina a identificar os nossos limites, assim como potenciais e qualidades positivas.

Para conquistar a clareza interior, precisamos nos desenvolver espiritualmente, isto é, despertar a compaixão por nós mesmos e pelos outros. A espiritualidade nos ajuda a sermos mais sensíveis às necessidades humanas, a nos aproximarmos das pessoas e das situações à nossa volta.

Em geral, estamos alimentando nosso ego ao ver nossa realidade como única. Isso nos torna frios e distantes com o mundo à nossa volta. Nos tornamos obsessivos ao acreditarmos que podemos controlar os outros para evitar nossas próprias emoções indesejadas. Quanto mais nos distanciamos dos outros, mais perdemos a visão clara de nós mesmos. Quanto menor for nossa capacidade humanitária, maiores serão os danos de nosso ego.

Quando tratamos os outros com ironia e sem afecto, estamos transferindo para eles nossas próprias dificuldades. Mas muitas vezes nos habituamos a reagir assim e nem nos damos conta de quanto sofrimento estamos criando para os outros e para nós mesmos. Não ferir os outros é uma acção preventiva para não ferirmos a nós mesmos.

Todos precisam se sentir amados, sentir que pertencem a um grupo social. Todos desejam se comunicar, trocar ideias, carinho, interagir de maneira amorosa. Quando alguém nos trata mal, facilmente nos sentimos melindrados, humilhados e ofendidos.

A vitalidade de nossa personalidade depende de nossa capacidade de trocar afecto, informação e contacto físico com os outros.
Quando nos abrimos para dar e receber satisfação física e mental, equilibramos nossa energia vital inspirando e expirando correctamente. Pois é ao trocar nossa energia pessoal com o mundo externo que recuperamos a vitalidade de nossa personalidade.

Cada vez que o equilíbrio já conhecido é perdido, vivemos uma sensação de crise. Quando mais limitada e menos permeável for nossa capacidade de troca com o mundo exterior, maior será nossa dificuldade em lidar com a crise.

A rigidez e a intolerância controem muralhas ao nosso redor. Quando essas muralhas são destruídas por acontecimentos externos, os efeitos são devastadores. Pois é altamente ameaçador expor a insegurança e fragilidade que elas escondiam. Quanto maior a rigidez, maior será a fragilidade que ela abriga.

Portanto, no momento da crise, quando temos que lidar com a mudança e a diversidade causada por ela, poderemos sentir até mesmo nossa sobrevivência como ameaçada.
Quanto mais obsessivos formos, menos espaço interior teremos para lidar com novas ideias, para identificar novas possibilidades sobre como superar uma crise. A obsessão nos impede de manter contacto com o mundo exterior. Nos isolamos e a crise aumenta.

Uma crise é directamente proporcional à rigidez dos limites interiores que cada um contrói dentro de si. Se formos flexíveis, seremos capazes de discriminar num momento de crise o que pertence e o que não pertence ao nosso desafio. Assim, poderemos ser permeáveis ao mundo externo, deixando nossa consciência ser tocada pela diversidade sem que esta se torne uma ameaça.

Uma prova de que estamos nos desenvolvendo espiritualmente é avaliar se nossa capacidade de tolerar os limites alheios tem crescido. Só nos tornamos tolerantes com a necessidade alheia quando estamos nutridos interiormente. Se estivermos em dívida para com nós mesmos, não teremos energia disponível para compartilhar com os outros.

O nosso mundo interior estabelece o modo com o qual iremos nos relacionar com o mundo exterior. Reagimos conforme nossas necessidades internas. Portanto, a vida parece sem significado quando damos pouca atenção ao nosso mundo interior, e nos sentimos distantes de nós mesmos. Dar atenção ao nosso mundo interior não quer dizer ficar apenas observando nossas carências, mas também reconhecer nossas qualidades positivas. Quando nos libertamos da atitude de auto comiseração, passamos a saborear nossa energia interior positiva.

Lamentarmos-nos só faz bem como um primeiro passo para expressar e conhecer nossa dor. No entanto, para curar uma ferida emocional, não basta expressá-la: é preciso ir um pouco mais adiante. É preciso reconhecer nossa habilidade de transformar essa mesma dor em sabedoria.

Quando a vida parece mais pesada do que podemos aguentar, trata-se de um sinal de que a atenção que temos dado ao nosso mundo interno não tem sido suficiente. Podemos reconhecer a natureza transitória da dor. Muitas pessoas se suicidam porque não reconhecem a transitoriedade da própria dor.

O desenvolvimento espiritual é dinâmico. Nós adquirimos nova força conforme nos propomos a seguir adiante. Tudo de que necessitamos é a coragem de seguir em frente.

SINUHE SILVA VIEIRA

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Somos Livres ou Determinados


Muitos dizem que a liberdade não existe. Alguns alunos, por exemplo, dizem: «Como somos livres se somos obrigados a passar longos períodos em salas de aula a aprender matérias que não nos interessam e os nossos pais nos impõem horas para voltar para casa? Como somos livres se não temos dinheiro para comprar uma moto, ou a playstation 2?»
Ser livre não significa que se pode fazer tudo o que se quer. A liberdade absoluta encerra uma contradição: se a liberdade significasse fazer o que se quer, então os mais fortes seriam livres para tirar a liberdade aos outros. Esta contradição mostra que se devem impor limites à liberdade em nome da própria liberdade.
Mas existem outros limites: estamos limitados pela nossa estrutura física e por isso não podemos voar pelos nossos meios naturais, respirar debaixo de água ou viver para sempre.
Mas apesar de todas as limitações há coisas que podemos fazer e que dependem da nossa vontade.
 
Por mais manipulados e condicionados que se seja, existe, em geral, a hipótese de podermos agir a partir da nossa própria vontade. Se esta possibilidade existe, por menor que ela seja, a liberdade existe.
Ligado ao problema da liberdade está o da responsabilidade. Ser livre significa que se tem de arcar com a responsabilidade daquilo que se faz. Quando alguém afirma que não é livre o que muitas vezes quer dizer é que não é culpado, atirando assim a responsabilidade para outrem.
Mas a liberdade pode ser pensada de múltiplas maneiras. Há quem a pense de forma exactamente oposta à que acabamos de ver. Existem pessoas que não querem ser promovidos a lugares de chefia porque, dizem, «têm mais responsabilidades». Daí Agostinho da Silva dizer que de certa maneira um capitão é mais livre do que um general. O capitão ao executar as ordens do general está livre das consequências dos seus actos, já que apenas cumpriu ordens.
A liberdade de expressão, é outra forma de liberdade. A história da humanidade está cheia de exemplos de limitação a esta liberdade. Mas a história da humanidade tem sido também a história da luta pela liberdade. Nas sociedades democráticas actuais gozamos de uma liberdade muito maior do que aquela que se viveu no passado.
O monge que se afasta do mundo procura, também ele, um tipo de liberdade. Que liberdade procurará? Do que se quer ele libertar? De que modo é pensada aqui a liberdade?

ESSÊNCIA E EXISTÊNCIA



CARÁCTER DA VIDA

Segundo Garcia Morente em Fundamentos da Filosofia, o primeiro carácter que encontramos na vida é o da ocupação. Viver é ocupar-se; viver é fazer; viver é praticar.
É um por e tirar das coisas, é um mover-se daqui para ali. Porém, se olharmos com mais atenção, a ocupação com as coisas não é propriamente ocupação, mas preocupação. Preocupamo-nos, primeiramente, com o futuro, que não existe, para depois acabar sendo uma ocupação no presente que existe.

Pelo fato de escolhermos, de termos um propósito, tanto vil como altruísta, nossa vida é não-indiferença.
O animal, a pedra e o vegetal estão no mundo, mas são indiferentes.
O ser humano não, ele tem que vivenciar a sua vida.
A vida se interessa: primeiro, com ser, e segundo, com ser isto ou aquilo; interessa com existir e consistir.

O movimentar-se refere-se ao tempo.
Que é o tempo?
Santo Agostinho já nos dizia que se não lhe perguntassem saberia o que era, mas quando lhe perguntam já não o sabia mais.
Por isso, há que se considerar o tempo cronológico e tempo psicológico.
Em se tratando da vida, temos de considerar o tempo psicológico, ou seja, considerar o presente como um "futuro sido".
No tempo astronómico, o presente é o resultado do passado. O passado é germe do presente, mas o tempo vital, o tempo existencial em que consiste a vida, é um tempo no qual aquilo que vai ser está antes daquilo que é, aquilo que vai ser traz aquilo que é.
O presente é um "sido" do futuro; é um "futuro sido". (1970, p. 308 a 311)

A vida foi nos dada, mas não nos foi dada feita.
Ela precisa ser construída.
Para que possamos construi-la, temos que lhe dar sentido e valor.
A moral reveste-se de transcendental importância, pois irá determinar todos os nossos actos.
Por isso, a moral não pode ser uma imposição social, mas património inalienável do espírito.
O que fazer é luta, é garra, é movimentar-se.
O que fazer, que é individual, não pode perder de vista o fim total.
Deve estar envolto com a cosmo visão transcendental da própria vida. Saber não é erudição: saber é saber ater-se.
 


Ortega y Gasset diz que o eu não é apenas eu, mas eu e minhas circunstâncias.
Para ele a vida não é teoria, mas realidade.
 A realidade é tudo que se nos oferece tanto aos olhos físicos como aos olhos espirituais.
São os nossos sonhos acordados, os nossos devaneios, a comida que ingerimos, a televisão que assistimos etc.
A vida é sempre a nossa vida.
Embora devamos respeitar a vida dos outros e não que sejamos o mais importante dos mortais, a vida é sempre a nossa vida, porque é através de nossas próprias lentes que conseguimos ver o "eu", o "outro" e o "nós".
Assim, faz muita diferença olhar o mundo sem defesas, sem melindres e sem segundas intenções.

 
A vida existe, mas pode não ser vivida.
É a indiferença.
A pedra, o vegetal, o animal existem, mas são indiferentes. O homem, ao contrário, tem que actualizar a essência e o faz na existência.
A actualização envolve a construção do seu destino.
Por isso, a contradição entre livre-arbítrio e determinismo.
A actuação do homem pressupõe escolha.
Escolher é seleccionar, é buscar alternativas, é construir. Nesse sentido, a formação de princípios éticos muito contribuirá para uma boa escolha de nossas acções.


Para J. P. Sartre, o indivíduo só vê angústia e desespero. A vida acaba com a morte.
O ser é um projecto que se aniquila com a morte.
Diz ele que a existência precede a essência.
O homem é um ser fáctico e nada mais.

Para o Espiritismo, cada um de nós é um ser que extrapola tempo e espaço. O fato social em que nos deparamos tem uma dimensão cósmica. Somos o resultado de todas as nossas pretéritas encarnações.

  
Uma essência pode se comunicar com outra essência.
Em se tratando da Doutrina Espírita, podemos comparar analogicamente a essência (da filosofia), com o conceito de Espírito, anotado por Allan Kardec, na pergunta n.º 23 de "O Livro dos Espíritos" - Que é o Espírito?
Resposta - Princípio inteligente do Universo. Para alguns filósofos, como Husserl, a essência não pode ser considerada isoladamente. Ela deve estar relacionada com a existência.
Para o Espiritismo, o Espírito manifesta-se através do perispírito.
Na mediunidade temos o exemplo de que uma essência pode se manifestar à outra por intermédio de uma outra. Allan Kardec, em O Livro dos Médiuns, mostra-nos que o Espírito do médium pode comunicar-se através do próprio médium. É a essência transmitindo através da própria essência.

Por que uma essência pura se contamina?
Por que existe a doença?
Por que as dores e os sofrimentos de toda a espécie? Por que as crises?
Allan Kardec, em O Livro dos Espíritos, analisando o problema da idiotia e da loucura deixa-nos claro que tanto uma como a outra são limitações da matéria e não da essência, que mantém a sua pureza intacta.
A comunicação mediúnica dos internados das "Casas André Luiz", que abriga portadores de deficiências físicas e mentais, mostrou que por detrás da deficiência orgânica há um Espírito lúcido em sua manifestação.
Por aí, vemos que as doenças são limitações do corpo físico e não do Espírito. Não são poucos os Espíritos, uma vez desencarnado, que voltam a ter a sua procedência normal.


Diante do exposto, devemos estar inteiros naquilo que estivermos fazendo. Todos os nossos actos, para se tornarem autónomos, devem ter um livre consentimento de nossa vontade e de nossa actividade. A autonomia da vida é seguir os ditames de nossa vocação. Não a vocação das profissões, mas aquela determinação que está dentro de cada um de nós. Em outras palavras, deve haver concordância entre a nossa vontade e a do Criador.

7. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

GARCIA MORENTE, M. Fundamentos de Filosofia - Lições Preliminares. 4. ed., São Paulo, Mestre Jou, 1970.
KARDEC, A. O Livro dos Espíritos. São Paulo, FEESP, 1972.
KARDEC, A. O Livro dos Médiuns ou Guia dos Médiuns e dos Doutrinadores. São Paulo, Lake, s. d. p.
LALANDE, A. Vocabulário Técnico e Crítico da Filosofia. São Paulo, Martins Fontes, 1993.
LEGRAND, G. Dicionário de Filosofia. Lisboa, Edições 70, 1982.
MORAIS, R. Stress Existencial e o Sentido da Vida. São Paulo, Loyola, 1997.
SANTOS, M. F. dos. Dicionário de Filosofia e Ciências Culturais. 3. ed., São Paulo, Matese, 1965.





domingo, 3 de julho de 2011

"Porque estou aqui?"


Uma Questão Fundamental
Por que estou aqui na terra?

De onde é que eu vim? Qual é o meu valor? Tenho algum valor intrínseco? Tenho algum propósito? Essas são questões fundamentais.

Elas são as "grandes questões" da vida. Como você responde a estas perguntas determina como você vê o mundo e como você trata o mundo. Porque você é uma parte do mundo, como você vê o mundo também determina como você vê e cuida de si.

Assim, é importante que resolvamos estas questões fundamentais. E é importante que descubramos a pura verdade. Respostas erradas a perguntas importantes não são úteis.
Onde devemos começar em nossa busca da verdade?

Começamos no início. Talvez a questão mais fundamental seja: “Deus existe?” Essa pergunta é fundamental porque as nossas respostas às outras "grandes questões" realmente dependem de como podemos responder a essa pergunta importante. Por exemplo...
Por que estou aqui?

A Cosmovisão Ateística
Por que estou aqui? Bem, se Deus não existe, isso significa que a vida tem que ter surgido através de algum processo impessoal, natural, sem inteligência e, no fim das contas, sem propósito. Isso significa que somos tão sem propósito quanto o próprio processo que nos trouxe à existência. A vida é apenas um acidente e você também.

Você pode encontrar motivos de curto prazo para a vida como se você estivesse aqui porque seus pais queriam ter filhos, etc., mas no fim das contas você é apenas um acidente e seus pais também. A vida é um grande acidente. Você não tem um propósito, você não vai causar nenhum efeito duradouro e no grande esquema das coisas a sua vida é totalmente sem sentido.

Sem um Criador no começo, não havia ninguém por perto para colocá-lo aqui de propósito, o que significa que não estamos aqui por uma razão. É muito simples.

No que diz respeito à pergunta "qual é o meu valor?", sem Deus não temos um valor intrínseco, pelo menos não um valor objectivo. Nosso valor é, em última análise, subjectivo. Você pode pensar que tenha algum valor, mas outra pessoa pode achar que você não vale nada, e enquanto não existir um Assessor transcendente para ter a palavra final, ninguém está certo ou errado.

Na verdade, sem Deus não existe o certo ou errado. John Dewey (1859-1952), o ateu famoso do século 20, explicou: "Nenhum Deus e nenhuma alma existem. Portanto, não há necessidade para os adereços da religião tradicional. Com o dogma e credo excluídos, então a verdade imutável também está morta e enterrada. Não há espaço para a lei fixa e natural ou para absolutos morais."1
Os filósofos geralmente concordam: sem um Deus absoluto para fazer as regras, não há tal coisa como um absoluto moral; há apenas preferências. Você realmente não tem o direito de viver; você simplesmente prefere não morrer. Alguém, por outro lado, talvez queira matá-lo independentemente de como você se sente sobre o assunto e quem pode dizer que estão errados?

Na ausência de moralidade absoluta, o poder reina supremo; os fortes sobrevivem e os fracos são explorados.
Felizmente a maioria dos governos enxerga como seu dever proteger o que vêem como o seu direito concedido por Deus para viver, e os governos também são a instituição mais forte entre os homens (o que significa que eles podem impor moralidade sobre aqueles que não necessariamente concordam com o seu direito de viver).

Os fundadores dos Estados Unidos da América explicaram bem quando declararam: "Consideramos estas verdades como evidentes por si mesmas, que todos os homens foram criados iguais, que são dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, que entre estes estão a vida , a liberdade e a busca da felicidade. Que a fim de assegurar esses direitos, governos são instituídos entre os homens, derivando seus justos poderes do consentimento dos governados..." Infelizmente, alguns governos não têm esse ponto de vista e o seu povo sofre terrivelmente por isso.

Por que estou aqui? - A Cosmovisão Teísta
Por que estou aqui? Bem, se Deus existe, isso significa que Ele é a realidade suprema.

Se Ele te criou por uma razão, esse é o principal motivo da sua existência. Se você é valioso para ele, esse é o seu verdadeiro valor.

O que Ele diz ser certo é absolutamente certo e o que Ele diz ser errado é absolutamente errado. Talvez sejamos agentes morais livres com a liberdade de tomar decisões morais, mas isso não significa que podemos escolher o que realmente é certo ou errado, isso significa apenas que somos capazes de escolher entre o certo ou errado.

Deus faz as regras. A pergunta é: Ele vai aplicá-las? Será que Deus vai nos fazer responsáveis por nossas decisões morais? O instinto que prevalece entre a maioria parece ser que sim, Deus vai nos fazer prestar contas. É como se a maioria das pessoas instintivamente soubesse que um dia vão ter que explicar todas as coisas ruins que fizeram (o que obviamente significa que também sabem instintivamente que existe algo como absolutos morais).
A verdade é que se Deus realmente existe, termos como "justiça", "propósito" e "moralidade" não são noções abstractas: Deus tem um propósito para você (é por isso que Ele te fez), foi Ele quem instituiu a moralidade e no final Ele vai fazer que a justiça prevaleça. Isso é um pensamento reconfortante para alguns, mas apavorante para outros

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Então não comece perguntando: "Por que estou aqui?" Comece perguntando: "Será que Deus existe?" Se Ele não existe, então realmente não há nenhum motivo para perguntar "por que estou aqui?" – nesse caso, tudo é, em última análise, inútil. No entanto, se Ele existe, você vai descobrir o propósito da sua vida quando você descobrir quem Ele é. Então comece do início. Será que Deus existe?

A Incoerência de Nossas Acções



Michel de Montaigne

Os que se dedicam à crítica das ações humanas jamais se sentem tão embaraçados como quando procuram agrupar e harmonizar sob uma mesma luz todos os atos dos homens, pois estes se contradizem comumente e a tal ponto que não parecem provir de um mesmo indivíduo. Mário, o Jovem, ora parece filho de Marte ora filho de Vênus. Dizem que o papa Bonifácio VII assumiu o papado como uma raposa, conduziu-se como um leão e morreu como um cão. E quem diria que Nero, essa verdadeira imagem da crueldade, como lhe apresentassem para ser assinada, de acordo com a lei, a sentença contra um criminoso, observou: — Prouvera a Deus que eu não soubesse escrever! — tanto lhe apertava o coração condenar um homem à morte. Há tantos exemplos semelhantes, e tão facilmente os encontrará sozinho quem quiser, que estranho ver por vezes gente de bom senso procurando juntar tais contradições, mesmo porque a irresolução me parece ser o vício mais comum e evidente de nossa natureza, como o atesta este verso de Públio, o satírico: “Má opinião, a de que não se pode mais mudar”.

É aparentemente possível julgar um homem pelos fatos mais comuns de sua vida; mas, dada a instabilidade natural de nossos costumes e opiniões, pareceu-me muitas vezes que os melhores autores erravam em se obstinar a dar de alguém uma ideia bem-assentada e lógica. Adotam um princípio geral e de acordo com este ordenam e interpretam as ações, tomando o partido de as dissimular quando não as deformam para que entrem dentro do molde preconcebido. O imperador Augusto escapou-lhes; deparamos nesse homem com tal flagrante diversidade de ações, tão inesperada e contínua no decurso de sua existência, que os mais ousados juízes, renunciando a julgá-lo em seu conjunto, tiveram de deixá-lo assim indefinido. Acredito que a constância seja a qualidade mais difícil de se encontrar no homem, e a mais fácil a inconstância. Quem os julgasse pormenorizadamente de acordo com seus atos, um por um, estaria mais apto a dizer a verdade a seu respeito.
Nossa maneira habitual de fazer está em seguir os nossos impulsos instintivos para a direita ou para a esquerda, para cima ou para baixo, segundo as circunstâncias. Só pensamos no que queremos no próprio instante em que o queremos, e mudamos de vontade como muda de cor o camaleão. O que nos propomos em dado momento, mudamos em seguida e voltamos atrás, e tudo não passa de oscilação e inconstância. “Somos conduzidos como títeres que o fio manobra” (Horácio).
 
Não vamos, somos levados como objetos que flutuam, ora devagar, ora com violência, segundo o vento: “Acaso não vemos todo mundo indeciso; uns procurando sem descontinuar, outros mudando de lugar, como para largar uma carga pesada demais?” (Lucrécio). Cada dia nova fantasia, e movem-se as nossas paixões de acordo com o tempo: “O pensamento dos homens assemelha-se na terra aos cambiantes raios de luz com que Júpiter a fecunda” (Cícero).

Hesitamos em tomar partido; nada decidimos livremente, de maneira absoluta, coerente. Se alguém traçasse e estabelecesse determinadas leis de conduta e regime político de vida, veríamos brilhar em seus atos e atitudes uma harmonia cabal e em seus costumes uma ordem e uma correlação evidentes. Empédocles observa a seguinte contradição entre os agrigentinos: alguns se entregam aos prazeres como se devessem morrer no dia seguinte e outros edificam como se a vida não tivesse de acabar jamais. O plano de vida fora, entretanto, fácil de se estabelecer, como se vê em Catão, o Jovem: quem nele toca uma tecla, toca todas, pois há nele uma harmonia de sons bem-afinados que nunca se entrechocam. Não seguimos, nós outros, tão sábio exemplo e cada uma de nossas ações decorre de um juízo específico. E, em minha opinião, seria melhor procurar-lhes as causas nas circunstâncias do momento sem mais aprofundada pesquisa e sem tirar delas quaisquer consequências.

Não somente o vento dos acontecimentos me agita conforme o rumo de onde vem, como eu mesmo me agito e perturbo em consequência da instabilidade da posição em que esteja. Quem se examina de perto raramente se vê duas vezes no mesmo estado. Dou à minha alma ora um aspecto, ora outro, segundo o lado para o qual me volto. Se falo de mim de diversas maneiras é porque me olho de diferentes modos. Todas as contradições em mim se deparam, no fundo como na forma. Envergonhado, insolente, casto, libidinoso, tagarela, taciturno, trabalhador, requintado, engenhoso, tolo, aborrecido, complacente, mentiroso, sincero, sábio, ignorante, liberal e avarento, e pródigo, assim me vejo de acordo com cada mudança que se opera em mim. E quem quer que se estude atentamente reconhecerá igualmente em si, e até em seu julgamento, essa mesma volubilidade, essa mesma discordância. Não posso aplicar a mim um juízo completo, sólido, sem confusão nem mistura, nem o exprimir com uma só palavra. “Distingo” é o termo mais encontradiço em meu raciocínio.

 Somos todos constituídos de peças e pedaços juntados de maneira casual e diversa, e cada peça funciona independentemente das demais. Daí ser tão grande a diferença entre nós mesmos quanto entre nós e outrem: “Crede-me, não é coisa fácil conduzir-se como um só homem” (Sêneca). Se a ambição pode impelir o homem a ser valente, sóbrio, liberal e mesmo justo; se a avareza pode dar coragem a um caixeiro criado no ócio e na indolência e infundir-lhe bastante confiança para que se lance à aventura em frágil navio, à mercê de Netuno, e lhe ensina a discrição e a prudência; se a própria Vênus arma de resolução e audácia o jovem ainda sob a autoridade paterna, e faz com que se mostre impudica a virgem de coração terno ainda sob a égide de sua mãe — “Passando furtivamente entre os guardas que dormem, protegida por Vênus, vai a jovem sozinha, dentro da noite, juntar-se a seu amante” (Tibulo) —; se assim é, não deve um espírito refletido julgar-nos pelos nossos atos exteriores; cumpre-lhe sondar as nossas consciências e ver os móveis a que obedecemos. É uma tarefa elevada e difícil e desejaria por isso mesmo que menor número de pessoas se dedicasse a ela




Fonte:Ateus.Net
autor: Michel de Montaigne
tradução: Sérgio Milliet
fonte:Textos de Interesse Filosófico
original: Ensaios; 2. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1980, pp. 159-162

sábado, 2 de julho de 2011

A Alma



É um termo vago, indeterminado, que expressa um princípio desconhecido, porém de efeitos conhecidos que sentimos em nós mesmos.
A palavra Alma corresponde à animu dos latinos, à palavra que usam todas as nações para expressar o que não compreendem mais que nós. No sentido próprio e literal do latim e das línguas que dele derivam, significa “o que anima”. Por isso se diz:
A Alma dos homens, dos animais e das plantas, para significar seu princípio de vegetação e de vida. Ao pronunciar esta palavra, só nos dá uma ideia confusa, como quando se diz no Génesis: “Deus soprou no rosto do homem um sopro de vida, e se converteu em alma vivente, a alma dos animais está no sangue, não mateis, pois, sua Alma.”

De modo que a alma em sentido geral se toma pela origem e causa da vida, pela vida mesma. Por isto as nações antigas acreditaram durante muito tempo que tudo morria ao morrer o corpo. Ainda é difícil desentranhar a verdade no caso das histórias remotas, há probabilidade que os egípcios tenham sido os primeiros que distinguiram a inteligência e a alma, e os gregos aprenderam com eles a distinção.
Os latinos, seguindo o exemplo dos gregos, distinguiram animus e anima; e nós distinguimos também alma e inteligência. Porém o que constitui o princípio de nossa vida, constitui o princípio de nossos pensamentos?
São duas coisas diferentes, ou formam um mesmo princípio? O que nos faz digerir, o que nos produz sensações e nos dá memória, se parece ao que é causa nos animais da digestão, das sensações e da memória?

Há aqui o eterno objecto das disputas dos homens.
Digo eterno objecto, porque carecendo da noção primitiva que nos guie neste exame, teremos que permanecer sempre encerrados num labirinto de dúvidas e de conjecturas.

Não contamos nem com um só apoio onde firmar o pé para chegar ao vago conhecimento do que nos faz viver e do que nos faz pensar. Para possuí-lo seria preciso ver como a vida e o pensamento entram em um corpo.
Sabe um pai como produz a seu filho?
Sabe a mãe como o concebe?
Pode alguém adivinhar como se agita, como se desperta e como dorme?
Sabem alguns como os membros obedecem a sua vontade? Terá descoberto o meio pelo qual as ideias se formam em seu cérebro e saem dele quando o deseja? Débeis autómatos, colocados pela mão invisível que nos governa no cenário do mundo, quem de nós poderia ver o fio que origina nossos movimentos?

Não nos atrevemos a questionar se a Alma inteligente é Espírito ou Matéria; se foi criada antes que nós, se sai do nada quando nascemos; se depois de haver nos animado no mundo, vive, quando nós morremos, na eternidade. Essas questões que parecem sublimes, só são questões de cegos que perguntam a cegos: que é a luz?

Quando tratamos de conhecer os elementos que encerra um pedaço de metal, o submetemos ao fogo em um crisol. Possuiríamos crisol para submeter a alma?
Uns dizem que é Espírito; porém, que é Espírito?
Ninguém sabe, é uma palavra tão vazia de sentido, que nos vemos obrigados a dizer que o espírito não se vê, porque não sabemos dizer o que é.
A alma é matéria, dizem outros. Porém, o que é matéria?
Só conhecemos algumas de suas aparências e algumas de suas propriedades; e nenhuma destas propriedades e aparências parece ter a menor relação com o pensamento.

Há também quem opine que a alma está formada de algo distinto da matéria. Porém que provas temos disso?
Se funda tal opinião em que a matéria é divisível e pode tomar diferentes aspectos, e o pensamento não. Porém, quem teria dito que os primeiros princípios da matéria sejam divisíveis e figuráveis?
É muito verossímil que não o sejam; seitas inteiras de filósofos sustentam que os elementos da matéria não têm forma nem extensão. O pensamento não é madeira, nem pedra, nem areia, nem metal, logo o pensamento não pode ser matéria. Mas esses são raciocínios débeis e atrevidos. A gravidade não é metal, nem areia, nem pedra, nem madeira; o movimento, a vegetação, a vida, não são nenhuma dessas coisas; e, sem dúvida, a vida, a vegetação, o movimento e a gravitação são qualidades da matéria.
Dizer que Deus não pode conseguir que a matéria pense, é dizer o absurdo mais insolente que se tenha proferido na escola da demência.
Não estamos certos de que Deus tenha feito isso; porém se que estamos certos de que poderia fazê-lo.
Que importa tudo o que se tenha dito e o que se dirá sobre a alma?
Que importa que a tenham chamado entelequia, quintessência, chama ou éter; que a tenham tomado por universal, incrida, transmigrante, etc., etc.?
Que importam em questões inacessíveis à razão, essas novelas criadas por nossas incertas imaginações?
Que importa que os pais da Igreja dos quatro primeiros séculos acreditassem que a alma era corporal?
Que importa que Tertuliano, contradizendo-se, decidisse que a alma é corporal, figurada e simples ao mesmo tempo? Teremos mil testemunhos de nossa ignorância, porém nem um só oferece vislumbre da verdade.

Voltaire

sexta-feira, 1 de julho de 2011

O Sentido da Vida

Nem todos se preocupam com a questão de saber se a vida tem sentido. Alguns e esses não são os mais infelizes  têm a mente de uma criança, que ainda não questionou tais coisas; outros, tendo desaprendido a questão, já não as questionam. Entre ambos estamos nós próprios, aqueles que procuram. Não conseguimos projectar-nos de novo no nível do inocente, para quem a vida ainda não olhou com os seus olhos escuros e misteriosos, e não nos interessa juntarmo-nos aos saturados e fatigados que já não acreditam em qualquer sentido na existência por não terem conseguido encontrar qualquer sentido na sua própria vida.

Aquele que não conseguiu atingir o objectivo que procurava na sua juventude, e que não encontrou nada que o substituísse, pode lamentar a falta de sentido da sua própria vida, mas pode ainda acreditar que a existência em geral tem sentido e pensar que tal sentido está presente nos casos em que uma pessoa atingiu os seus objectivos.
Mas aquele que, depois de muito esforço, conseguiu atingir os seus propósitos, e que depois descobriu que o seu prémio não é tão valioso como parecia, de alguma maneira sente-se enganado  confronta-se abertamente com a questão do valor da vida e diante dele, como um solo sombrio e devastado, permanece o pensamento de que, para além de todas as coisas serem transitórias, em última análise tudo é em vão…

Qual é a razão para a estranha contradição que consiste no fato de o sucesso e a satisfação não se fundirem num sentido apropriado?
Não parece prevalecer aqui uma lei inexorável da natureza?
O ser humano estabelece objectivos para si próprio, e enquanto os persegue apoia-se na esperança, é verdade, mas ao mesmo tempo vive atormentado pela dor do desejo insatisfeito. Logo que atinge o objectivo, no entanto, depois da primeira sensação de triunfo segue-se inevitavelmente um sentimento de desolação. Permanece um vazio, que aparentemente só pode culminar com a emergência dolorosa de novas ambições, com o estabelecimento de novos objectivos. Assim recomeça o jogo, e a existência parece estar condenada a ser uma oscilação incansável entre dor e aborrecimento que termina com o nada que é a morte. Esta é a célebre linha de pensamento que está na base da visão pessimista da vida de Schopenhauer. Não haverá uma maneira de lhe poder escapar?…

Na verdade, nunca encontraremos um sentido último na vida se a virmos apenas sob o aspecto do propósito.